REFLEXÕES sobre a profissão de
BIBLIOTECÁRIO
Júlia
Gonçalves da Silveira*
Profissões e
vocações são como plantas. Vicejam e florescem em nichos ecológicos, naquele
conjunto precário de situações que as tornam possíveis e, quem sabe, necessárias.
Destruído esse habitat, a vida vai se encolhendo, murchando, fica triste,
mirra, entra para o fundo da terra, até sumir. (RUBEM ALVES, 1985).
A profissão de
bibliotecário, para aqueles que desconhecem a missão, a natureza do trabalho e
atribuições que cabem a esse profissional na sociedade, pode ser entendida ou
estereotipada como limitante, singela, monótona e desprovida de desafios. Em
determinados contextos sociais, notadamente naqueles em que a educação não
constitui prioridade que motive ou possibilite o desenvolvimento pleno e ideal
das pessoas, das organizações sociais ou das comunidades, a vida das
bibliotecas e, em consequência, a dos bibliotecários, vê-se atingida por
desafios e lutas de sobrevivência.
O
bibliotecário, quando disposto e preparado para exercer bem os seus diversos
papéis, incluindo o de agente de mudança social deve integrar as funções da
biblioteca e da informação às demais ações vitais da sociedade. É consenso
universal que a informação se constitui em insumo básico para a geração de
conhecimentos. Ela pode auxiliar em soluções de problemas que afligem o homem e
as organizações integrantes da sociedade. Mola propulsora de desenvolvimento
pessoal e organizacional, a informação é matéria-prima do trabalho cotidiano do
bibliotecário, a quem cabe conhecer profundamente os seus diversos suportes,
canais de veiculação, tipologia e características das mais diversas fontes de
informação nacionais e internacionais para realizar atividades inerentes a sua
profissão. Atividades que envolvem identificação, seleção, tratamento,
conservação preventiva, disseminação e maximização de uso das informações
organizadas e disponíveis nas bibliotecas contemporâneas reais ou eletrônicas.
Os registros
do conhecimento humano e as formas de comunicação evoluíram. Talvez aí esteja a
pista de novas possibilidades, de abertura de campos emergentes para inserção
do bibliotecário, a quem, ao longo da história, sempre coube a função de
identificar, selecionar, organizar e disseminar informações.
Os avanços
tecnológicos propiciam a concretização de instrumentos que podem facilitar ou
impedir a evolução de seu trabalho e de sua forma de executá-lo. Acompanhando a
evolução do mercado de informação, com postura crítica em relação não apenas a
esse mercado, mas diante de sua inserção individual e coletiva na sociedade, a
tendência do profissional bibliotecário é sobreviver e progredir.
Em 1945, em
artigo clássico intitulado As we may
think, Vanevar Bush já previa a necessidade do “indicador de pistas,
pessoas que têm prazer em encontrar pistas úteis no enorme volume do registro
comum”. Estaria prevendo a necessidade de bibliotecários e/ou profissionais
encarregados de gerenciar o caos de informações não organizadas? O volume e a
variedade de informações disponibilizadas pela internet que, paradoxalmente,
podem trazer sérias dificuldades para seus usuários, constituem campo fértil e
promissor para aqueles profissionais que dominam tecnologias de organização e
de tratamento da informação.
Interferir e
auxiliar em processos de formação de competência informacional é, a nosso ver,
uma das funções mais nobres dos bibliotecários, pois seu trabalho envolve a
educação de usuários de informação, instruindo-os e auxiliando-os em processos
de formação de habilidades para o uso adequado, bem como na avaliação de
conteúdos constantes do universo informacional.
Acredito que
sua missão deverá centrar-se na utilidade social das bibliotecas ou de unidades
de informação reais ou virtuais, e na contribuição pessoal que poderá prestar
ao desenvolvimento de pessoas e organizações que necessitam de informação para
preparar seu trabalho, solucionar problemas, praticar o lazer e entretenimento,
entre outras ações.
Concordo com
autores, como Guinchat e Menou, que defendem em sua obra Introdução geral às
ciências e técnicas da informação e documentação que não existe um novo profissional
da informação, e sim o profissional da informação que lida com novas
tecnologias e com contextos de organização das empresas e das entidades
públicas, interagindo com outras formas de gerenciamento, planejamento e
avaliação de resultados.
Durante a chamada
“era industrial”, as pessoas iam “fisicamente” às bibliotecas. Hoje, na era da
tecnologia, da informação e do conhecimento, as bibliotecas, mais do que nunca,
precisam ir à comunidade, o que pode ser viabilizado por meio de gama enorme de
instrumentos de comunicação. As bibliotecas atuais devem ser compostas de
materiais reais e virtuais e adotar formas diversificadas de acesso ao conjunto
de tecnologias e recursos informacionais internos e externos. O ponto básico a
se considerar não deve ser a tecnologia em si mesma, mas a possibilidade de
intermediar acesso à informação de forma mais ágil, eficiente e eficaz e de
atender necessidades de pessoas, inclusive promovendo o seu papel de
bibliotecário-educador, levando-as ao letramento, alfabetizando-as e dotando-as
de competência informacional.
Sua missão
deverá centrar-se na utilidade social de seu trabalho, na contribuição como
agente mediador de necessidades de informação de usuários que buscam ou esperam
que a biblioteca possa atendê-los, interferindo positivamente no processo de
crescimento dos seres humanos.
O futuro da
profissão e das bibliotecas parece claramente condicionado às respostas que
profissionais e instituições puderem dar aos anseios e demandas das sociedades
de seu tempo e do futuro. Cabe ao bibliotecário contemporâneo zelar pelos
destinos de sua profissão e pelas oportunidades de ampliação de seus espaços de
trabalho no mundo real e no ciberespaço.
*Professora do
Departamento de Organização e Tratamento da Informação da Escola de Ciência da
Informação da UFMG (agosto de 2006 a dezembro de 2017).
*Bibliotecária/Documentalista
da Universidade Federal de Minas Gerais (agosto de 1982 a julho de 2006).
OBS.: Compartilho este texto que publiquei no Boletim da Universidade Federal
de Minas Gerais, em 2011. Reafirmo o que penso sobre a temática, em
foco, e acrescento a minha preocupação no sentido do papel social que
deve ser assumido com muito vigor e responsabilidade pelos
bibliotecários, profissionais da informação, no contexto nacional e
internacional, de modo a contribuir e lutar pela manutenção e
desenvolvimento de instituições sociais e educacionais, a exemplo das universidades públicas e gratuitas,
organizações culturais, institutos de pesquisa, entre outros órgãos
similares. Inquestionavelmente, neles ocorrem a geração de
conhecimentos, o ensino, a educação, as pesquisas, a produção
técnico-científica, responsáveis pelo literal desenvolvimento
científico, tecnológico e social dos países, de modo geral e, em
consequência, dos povos que neles habitam...
Acesso em: 12 mar. 2019.